Somos Feitos de Amigos

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Amigos, intimidades e o útil verbo conflitar

A multiplicação do peixe, do pão, da ternura

Referenciais, estímulos, singularidades e decantações.

Somos feitos dessa amizade de nos reconhecermos

no outro lado do espelho

Trocamos lágrimas, danações, prismas e fermentos

E sobrevivemos então, assim

Pelo mimo da compreensão

e dessa existência graciosa deles…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Trocamos tijolos e pedras de amarelinha

Para a construção de nossa persona espiritual

Como garantia de estimulante sobrevivência recíproca.

Cada amigo, um pedaço de céu azul

no nosso horizonte envelopado

Cada troca de confidência,

uma assinatura de reconhecimento mútuo

E assim vamo-nos indo por causa deles…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Um pai-referencial, uma mãe de peregrinação,

uma irmã de jasmim

E multiplicamos a resistência da enfrentação

para consumo próprio

Contra o sal, a dor, a frustração,

sempre em favor do açúcar deles…

A grande família da espécie amiga

A palavra certa, o aperto de parafuso solto

às avessas do polimento

A caixa de pandora de sabedorias

e sinais de trâmite livre no campo minado

E a sensação de enriquecimento da alma gêmea

em cada distribuição de interioridade hospitaleira…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Porque líquidos e orgânicos iguais se atraem,

São encaminhamentos do mesmo dínamo

E toda luz reflete luz para somar energias positivas.

Podemos ser traídos, abandonados,

punidos inocentemente até

Mas o amigo fiel sempre estará ali, ao nosso lado

como uma escora de afeto e aceitação

Confiando em nós

porque criou dependência de escala repositória

na sua alma-avelã…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

E não de interesse, misericórdia, piedade,

butim ou purgação

Porque nos aceitam como somos, frágeis, vazantes

ou sonhadores

A outra parte nossa,

um segmento de nuvem chorando junto

Por isso a sagracial confraria dos desgarrados

que se multiplicam

Reside nesse redil de amizades, alegranças e bravezas

Funda âncora no coração de quem ainda tem coração

E se eterniza na hora dos recolhes

de pertencimentos semelhantes…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

O colega do jardim de infância, o poeta virtual,

o solitário recolhedor

Além do correspondente que, em Saigon

nos pede como talismã da sorte

a nossa coleção de canivetes

Porque confia em nossa disposição

para lutar contra moinhos e ventos.

Assim sobrevivemos por causa deles

E somamos todos esses elos,

numa corrente de suporte emergencial

No amor e na dor, na mesma residência além dessa

nosso finito entendimento da raça humana

Porque o grande amigo é aquele que vela por nós

no nosso sonho impossível ou numa rota de fuga…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Alguns até perdoam nossas pensagens sinceras,

às vezes

Outros se encantam

com a nossa coleção de pedra-sabão

ou de remos usados

Ou simplesmente nos amam

com nossas muletas de ócios legados…

Vivemos mesmo pela consciência do cultivo deles

Curamos a depressão pelo entendimento tácito

de nosso pedido de socorro

E, ainda, às vezes, esses amigos indispensáveis

Respiram a filosofia de nossas violetas cósmicas…

Somos feitos de pessoas que conhecemos

Sem eles jamais seríamos os mesmos

Seríamos náufragos como Crusoés cegos

em ilhas vulcânicas

Mas viçamos e respondemos a estímulos vitais

por causa do amparo deles…

Deus criou o Amigo porque não pode estar em todo lugar

E então assim se fez muito bem representado

eternalmente

Em nossa alma nos dando a fortaleza

para administrarmos a difícil sobrevivência

humanamente possível

Quando somos forte

sem saber que tínhamos tanto potencial

para consertos e reedificações…

Somos feitos de amigos que conhecemos

Somos feitos de amigos que amamos

e sempre nos compreendem

Somos feitos de amigos que nos escolheram

antes mesmo de nascerem

E de nós nascermos,

como um pacto além do jardim do éter

E a eles devemos proteção, respeito, coragem e honraria.

Sem eles não teríamos conseguido,

Sem eles não seríamos nada do que somos,

Porque quando morre um Grande Amigo aqui na terra,

no Céu

Deus dá diploma de anjo-guardião

ao recolhedor de nossas lágrimas de aprendizados…

Silas Corrêa Leite